sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Entrevista do Reitor no Blog do Roberto Moraes

Transcrevemos na íntegra a entrevista do prof Almy ao blog do Roberto Moraes:

O reitor da Uenf, Almy Junior, explica nesta entrevista o que causou o impasse salarial na Universidade – que redundou na greve deflagrada em 16 de agosto – e os caminhos que estão sendo construídos para superá-lo. Almy destaca a interlocução com o secretário de Ciência e Tecnologia, Luiz Edmundo Horta, que veio dialogar com a comunidade acadêmica no dia 1º de setembro, e as negociações em torno da caracterização da Dedicação Exclusiva (D.E.) dos professores. Como a Uenf não paga adicional de D.E., o que é norma nas universidades públicas, a saída para o impasse pode estar na correção desta lacuna. Almy faz ainda uma análise instigante sobre o processo de aproximação da Universidade em relação à sociedade regional e diz que quem fala em sucateamento troca o ‘senso crítico’ pela ‘absoluta falta de bom senso’. Veja a entrevista:



BlogComo o senhor vê este impasse na melhoria dos salários dos docentes?
Almy: Vejo como algo que surgiu de um conjunto de incompreensões, notadamente de setores do próprio governo estadual, mas que felizmente caminha para um definitivo clareamento. Ontem (01/09) tivemos uma sessão extraordinária do Conselho Universitário em que o secretário de Ciência e Tecnologia, professor Luiz Edmundo Horta, conversou francamente com os conselheiros e demais membros da comunidade universitária. Em síntese, o secretário admitiu que a exclusão dos docentes da Uenf do reajuste concedido aos técnicos-administrativos da Universidade se deveu a um equívoco da área técnica do governo. Eles compararam os salários iniciais do professor da Uenf, que tem necessariamente Dedicação Exclusiva (D.E.) e hoje é de R$ 5.497, com os salários iniciais de professores da Uerj e Uezo, que não têm a D.E. e que hoje é de R$ 4.888,00 e será dos mesmos R$ 5.497 no ano que vem. Verificaram, portanto, que os valores hoje pagos na Uenf correspondem aos que serão pagos na Uerj quando for concluído o reajuste escalonado que já está sendo concedido por lá, parcelado em vários meses. Por isso acharam que a Uenf não precisaria de reajuste e levaram o governo a corrigir apenas os vencimentos do pessoal técnico-administrativo. Em grande medida, isto levou ao impasse que vivemos hoje.
Blog: Qual a solução?
Almy: Nossa proposta, definida consensualmente no Conselho Universitário após a conversa com o secretário, é que o governo não apenas corrija o equívoco pontual, mas estanque a fonte para futuros novos equívocos. Ou seja, estamos encaminhando uma correspondência, na condição de presidente do Consuni, solicitando ao governo que caracterize formalmente a Dedicação Exclusiva (D.E.) que efetivamente vigora na Uenf. Veja: o Estatuto da Uenf estabelece a D.E., os editais de concurso trazem esta cláusula, os professores são obrigados a cumpri-la, mas, para fins de remuneração, é como se ela não existisse. Não há nada no contracheque que se refira a esta cláusula, ao contrário do que ocorre em qualquer universidade pública brasileira. Se o impasse foi criado por este equívoco, nada mais sensato do que desfazer as bases que permitiram que o equívoco ocorresse. O secretário Luiz Edmundo se comprometeu a levar a demanda ao governador ainda nesta sexta, 03/09. Nas universidades federais a D.E. implica um adicional de aproximadamente 55% em relação ao que ganha um professor em regime de 40 horas.Blog: Qual a sua posição pessoal e da equipe dirigente da Universidade sobre a construção desta solução?
AlmyNós da Administração estamos muito seguros do caminho a ser seguido, que, por sinal, mantém a linha de uma negociação inteligente com o governo. Como a lei eleitoral não permite que se conceda reajuste salarial neste período, é um erro insistir em qualquer tipo de percentual neste momento. Dado o rigor da legislação eleitoral, que é um avanço para toda a sociedade brasileira, o gestor não pode sequer prometer coisa alguma nesse terreno, sob pena de sofrer demandas judiciais contra sua própria candidatura à recondução ao cargo. Ao focarmos a questão da Dedicação Exclusiva, contornamos estas restrições legais e propomos a construção de um marco definitivo. E temos condições políticas muito mais favoráveis ao êxito, já que estamos trabalhando em cima da correção de um equívoco assumido pelo próprio governo. Observe que nós da Administração, em nome da instituição, não estamos solicitando nada a mais nem a menos do que a equiparação dos salários dos professores da Uenf com os das nossas coirmãs estaduais, a Uerj e a Uezo. A gente nivela os salários e concede o adicional da D.E., como parte do salário, aos professores sujeitos ao regime nas três instituições.Blog: Quais as conseqüências do estrangulamento e da inviabilização das negociações para a vida da Universidade?
AlmyOlha, nenhuma greve é isenta de graves consequências, por isso é um instrumento que não se aciona a toda hora, embora seja em tese legal e legítimo. O problema mais visível é a interrupção nas aulas, que significa um transtorno geral (inclusive para os próprios servidores em greve), mas especialmente para os alunos. Os que estão cursando o último período tendem a ser os mais afetados, na medida em que terão sua formatura atrasada, e quem sabe poderão perder oportunidades importantes de inserção profissional. Há um certo senso comum que afirma que os alunos são os únicos prejudicados, mas não é bem assim. Muitas vezes as pesquisas de fato não param, até porque as agências de fomento não se submetem a problemas específicos ocorridos em cada instituição. Mas os trabalhos são atingidos, inclusive devido à adesão de servidores que são parte importante na condução dos experimentos. Por sua vez, a área de extensão não atua com o dinamismo que seria observado em condições normais, porque afinal há uma situação de anormalidade institucional. Aliás, temos que desconstruir certa noção de que greve no serviço público é coisa corriqueira. Não é! Greve é um ato extremo, desencadeado por uma ou mais categorias de trabalhadores em defesa de direitos que se alega serem desrespeitados. No caso do serviço público, em que pesem os erros e acertos dos gestores, nosso patrão não é o prefeito, o governador, ou o presidente, mas a sociedade brasileira. E o cidadão não pode ser diretamente responsabilizado pelos atos ou omissões dos gestores. Portanto situação de greve é sempre uma questão delicada, que deve ser conduzida com o máximo de equilíbrio e respeito com a coisa pública. De nossa parte, alertamos sistematicamente o governo quanto à necessidade de correção dos salários na Uenf, em vista de sua corrosão frente aos praticados pelas federais. 
Blog: Na mobilização do movimento reivindicatório tem se falado sobre o sucateamento da universidade. De fora, há a sensação de que a UENF tem cada vez mais avançado no seu trabalho com resultados crescentemente positivos. Como você vê estas posições antagônicas?
AlmySe um dia eu disser que a Uenf ou qualquer outra instituição não tenha problemas, devo antes abdicar do meu diploma. Pois eu e todos os que tiveram o mesmo privilégio de estudar numa universidade pública fomos formados para sermos o olho crítico da sociedade. Mas daí a falar em ‘sucateamento’ vai a distância do senso crítico para o seu oposto, que é a absoluta falta de bom senso. Vou te contar uma coisa: no tempo do brilhante professor Braz, meu antecessor na Reitoria, de quem fui pró-reitor de Graduação, a Universidade vivia numa carência realmente grande de recursos para tocar o seu dia a dia. Mas mesmo ali, em que sofríamos com a miopia do governo quanto à importância de dar o mínimo para a Uenf se manter, conseguíamos montar laboratórios, comprar equipamentos, desenvolver pesquisas e projetos, tudo isto graças principalmente à capacidade e ao potencial do nosso pessoal. Então, enquanto uns iam para a imprensa repetir chavões como o sucateamento, a UENF recebia prêmios nacionais de Iniciação Científica, obtinha destaques nas avaliações do MEC e continuava construindo sua caminhada vitoriosa. Isto naquele contexto em que realmente faltavam recursos para compromissos elementares. Nos últimos três anos, que correspondem ao período em que estou à frente da Reitoria, a situação quanto à manutenção do cotidiano mudou radicalmente. Não temos hoje nenhuma fortuna, mas podemos administrar com mais planejamento, sem o constante ‘apagar de incêndios’ de um passado recente. Este contexto nos permitiu algumas ações de otimização e racionalização que se refletem em melhorias muito concretas na infraestrutura e nas condições de trabalho, como a iluminação, a limpeza, a condição dos banheiros, a demarcação do campus, a adequação de espaços de trabalho etc. Outro dia estávamos fazendo as contas para incluir um dado num relatório de prestação de contas e vimos que nestes três anos adquirimos mais de 500 aparelhos de ar condicionado para melhorar a condição de trabalho na Universidade! Pudemos tocar obras importantes, como um prédio novinho para salas de aula e laboratórios de ensino, áreas de convivência, estacionamentos, uma sede própria para o Diretório Central dos Estudantes e o Restaurante Universitário, que está em construção. O reitor obviamente respeita e preza a autonomia do movimento sindical, mas pessoalmente não compreendo como algumas lideranças parecem experimentar uma espécie de satisfação ao atirar no próprio barco em que estão navegando.
Blog: Aparentemente a comunidade hoje, mais que ontem, consegue enxergar a importância da Universidade no desenvolvimento social, econômico e ambiental de nossa região. Como vê o atual estágio de relação da Uenf com a comunidade regional?
AlmyVejo um progresso enorme, a despeito de olhar para frente e enxergar também o quanto ainda falta avançar. Essa questão é recorrente, e a meu ver é preciso considerá-la sob duas perspectivas: os esforços de integração empreendidos ‘de dentro para fora’ e os desdobramentos disto ‘de fora para dentro’. Nos primeiros anos construiu-se uma imagem de certa arrogância do segmento acadêmico, e isto trouxe um custo para a integração da Universidade. Eu não faria disto uma leitura simplista, do tipo ‘os cientistas da Uenf são todos vaidosos e prepotentes’, nem uma leitura oposta, igualmente simplista, do tipo ‘a sociedade de Campos não foi acolhedora e se fechou à convivência com aquele grupo’. Para mim houve um pouco das duas coisas, um processo de mútuo reforço. Então coube à Universidade, a certa altura de sua trajetória (que eu localizaria mais precisamente na gestão do professor Raimundo Braz Filho), dar um passo em direção à cooperação plena com a sociedade organizada e o Poder Público. A resposta foi aquela que gostaríamos? Aqui e ali sim, mas nem sempre. Nestes últimos anos, temos aprofundado o movimento de interlocução com as prefeituras, as entidades da sociedade organizada, as organizações do terceiro setor, as escolas públicas, o segmento artístico e cultural, enfim, com todas as instâncias possíveis. Olhe como avançamos na interação entre Uenf, IFF e UFF, realizando conjuntamente Congressos de Iniciação Científica e Mostras de Extensão! Temos feito esforços mais efetivos em nossa área de comunicação, criando, por exemplo, a revista Nossa UENF como canal periódico de informação sobre os projetos que têm impacto na sociedade. Portanto me parece que avançamos muito nesse terreno, embora no quesito específico do Poder Público local estejamos ainda muito aquém do que recomenda o interesse público. Mas aí há que se considerar também a peculiar situação política do município de Campos, em que não se consegue proteger a soberania do voto popular destes mecanismos de abuso de poder sistematicamente punidos pelos tribunais. Se com continuidade havia problemas, com estas seguidas interrupções fica ainda mais difícil. Mas temos que perseguir esta meta.
Blog: A Uenf através do seu Conselho Universitário traçou metas para a expansão da Universidade. O que o senhor julga possível de ser viabilizado no curto e médio prazos?
AlmySe houver vontade política do governo estadual, dá para a gente se implantar no Noroeste e ampliar o campus de Macaé já em 2011. No caso do Noroeste, por exemplo, há o desejo da população, manifesto em abaixo-assinado e referendado por vários prefeitos da região. Se optarmos por Italva, que é a proposta mais concreta neste momento, já temos lá toda uma estrutura pertencente ao Estado e hoje subutilizada. Mas o governo precisa autorizar concursos para professores e técnicos e ampliar o orçamento da Universidade, pois não vamos fazer da expansão uma aventura sem instrumentos que garantam a perenidade de nossa presença. Em Macaé, o projeto aprovado pelo Conselho Universitário é oferecer, além dos atuais cursos de graduação e pós-graduação Stricto sensu de Engenharia de Exploração e Produção de Petróleo, carreiras ligadas às áreas de Meteorologia e outras engenharias. Aliás, a ‘engenharia política’ capaz de viabilizar a expansão não é tão simples dada a multiplicidade de atores envolvidos, mas não deixa de ser irônico que neste caso é a Universidade quem está querendo sair de seus atuais limites, enquanto geralmente é o Poder Público quem demanda a expansão e tem até que vencer resistências corporativas dentro do meio acadêmico. Mas esta é a boa política: consumir nossas energias em negociações longas, árduas, às vezes com jeito de estéreis, para fazer surgir ou encorpar iniciativas que promovem o cidadão e a sociedade. Estou convencido de que nossa região precisa demais do esforço do meio acadêmico local no sentido de entender as mudanças que estão vindo e trabalhar para que a população seja protagonista, não objeto.

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito bem!

Anônimo disse...

O Reitor está equivocado! O Impasse que vivemos hoje é por causa da reposição salarial de 82% que não foi concedida a todos os servidores da UENF (técnicos e docentes). A Greve já estava anunciada, dia e hora, e nada foi feito pelo governo Cabral para adiantar as negociações.
Em um suspiro de loucura o Governador concedeu a várias categorias um mísero reajuste, em torno de 5%, pois em sua maioria já vinham recebendo as correções anuais. No caso da UENF o governo juntou os quatro anos e anunciou 22% ainda em 12 vezes!
O impasse da greve se deve ao NÂO RECONHECIMENTO DAS PERDAS SALARIAIS QUE TIVEMOS EM NOSSOS SALÁRIOS E QUE JÁ ALCANÇAM MAIS DE 82%!!!
SE DEVE, DENTRE VÁRIOS FATOS, AO VETO DE 10 MILHÕES JÁ ACERTADOS PARA O REAJUSTE NO ANO PASSADO!
FALTA DE COMPROMISSO COM O ENSINO! Ou será que estamos em penúltimo lugar no ranking nacional na qualidade de ensino por puro ERRO DO GOVERNO?
ME POUPE DE OUVIR BESTEIRAS!!!!